quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

3 PERGUNTAS PARA O CEREZO


Quem pensa que o nome é uma homenagem ao volante do Atlético Mineiro e da Seleção Brasileira de 1982 se engana. O Cerezo homenageado é outro: o mitológico músico/roqueiro da noite de São Bernardo do Campo (SP), falecido em 2009 (até onde eu sei). Mas voltemos ao Cerezo-banda: Rafael Crespo (guitarra/voz), Tinico (baixo/voz) e Babalu (bateria). Sonoridade retrô, anos 80, letras em português, uma demo com 5 músicas e esse bate papo exclusivo com o Zinismo. Conheça o Cerezo!

Zinismo: Vocês são amigos de longa data. Mas como surgiu a ideia de fazer essa banda juntos? E por que agora?
Tinico: Bom, antes de conhecer e me tornar amigo do Rafa, eu era fã dele. Quando era mais novo, lembro que um dia (em 1994 ou 95) tive uma folga no McDonald's, e me tranquei no quarto pra cheirar gás de geladeira (freon 12) e escutar Planet Hemp. Eu ficava viajando nas guitarras, achava aquele monte de delay a coisa mais foda do mundo, literalmente entrava dentro do som (risos). Não imaginava na época que um dia conheceria o cara que tocava essa guitarra... Muitos anos depois acabei conhecendo o Rafael através do Polara e do Carlinhos (Dias), porque eu morava em Porto Alegre e pirava nas bandas de hardcore, comprava tudo por correio, trocava carta, comprava zine... Um belo dia eu cresci e acabei vindo morar em SP. Fã de Polara que sou e de som emo/hardcore, acabamos nos aproximando.

Quanto a ideia da banda, foi 100% do Rafael, e acredito que foi uma mistura de saco cheio com a fase folk que ele tinha passado e uma tentativa de voltar a ser jovem. Tipo ele se olhou no espelho e pensou: "sou punk, meu negócio é hardcore e é isso que eu quero fazer". A banda é um desabafo, uma tentativa do Rafa, e consequentemente nossa, de expressar um monte de coisa que estava entalada na garganta. O Rafael é músico, sofreu toda essa mudança do mercado musical, é roqueiro mesmo, sobreviveu às diferentes décadas, e eu acho que o Cerezo é o espelho disso: é o Rafael fazendo uma coisa que realmente acredita.

Eu sou outro cara. Tive umas bandas no sul quando era mais novo, venho do skate, cresci escutando hardcore e suas variantes, mas não sou um músico. Toco mais na vontade mesmo, sou tatuador, meu dia-a-dia é bastante corrido, preciso me esforçar para conseguir ter a banda. Acredito que o Rafael me chamou porque existe uma afinidade muito grande entre a gente, desde o lance do som que a gente gosta, do nosso humor, das piadas, até o lance da gente ser espírita. Eu não sou um baixista foda, mas a gente curte Jawbreaker, saca? (risos)

O Babalu veio depois. O (Marcelo) Fusco tocou com a gente um tempo, mas ele tem outras bandas, trabalha todo dia com horário fixo, e depois de alguns meses percebeu que não estava afim de tocar "hardcore" e achou melhor sair. E foi bom, porque o Babalu é um cara que escuta Lagwagon! (risos) Esses dias a gente estava ensaiando e eu falei que o melhor som pra correr na esteira era Pennywise, que eu corria 7km sem sentir, porque o som me ajudava. Aí falei que eu tava tipo um adolescente, que tinha baixado os discos do Lagwagon e estava escutando o Hoss. O Babalu me olhou, e falou, "eu também tô escutando esse disco", e a gente caiu na risada! Os ensaios estão sendo cada vez mais divertidos.

O Cerezo tá massa por causa disso, a gente tá em sintonia e ninguém tem vergonha ou medo de falar o que pensa. Eu e o Babalu estamos na onda do Rafa, a gente gosta das músicas, a gente ensaia com vontade, curtindo mesmo, e mesmo a banda tendo pouco tempo, a gente tá começando a se soltar. Acho que o Cerezo é isso, três caras fazendo um som e curtindo.

Zinismo: O nome Cerezo é uma homenagem ao mitológico cantor do ABC?
Rafael: Esse nome surgiu numa viagem. Estava indo com o Againe para algum lugar fazer um show, e no busão o Carlos lançou essa história, que ele estava andando na rua e um cara o confundiu com outra pessoa, e perguntou se ele não era amigo do Cerezo, black metal de São Bernardo. Ele não entendeu nada e perguntou, "Quem? Banda de black metal Cerezo?” Aí a gente ficou rindo, imaginando uma banda com esse nome, e de black metal! Mas eu nem tava ligado que o Cerezo existia de verdade, fiquei sabendo dele quando você me contou.

Zinismo: Achei o som bem oitentão, com muita referência de skate rock, e também de umas paradas tipo Ira! dos 3 primeiros discos, e até Embrace... É por aí?
Tinico: Sinceramente eu não conheço Ira!, vou até baixar os discos... mas a pegada do Rafa é ir contra a corrente. Um dia a gente estava ensaiando e eu falei: "normalmente uma base como essa teria uma distorção pra ficar mais definida", e o Rafa respondeu: "é justamente por isso que eu não uso", e a gente caiu na risada... mas deu a calhar que bem quando a gente começou a tocar, eu tava escutando sem parar umas 3 músicas do Men At Work... eu escuto tudo que é tipo de música, escuto muito Dub, e nessas de reggae eu gosto até de umas coisas mais pop, tipo Eddy Grant e Black Uhuru... os anos 80 têm muito Chorus nas guitarras, né? Flanger... mistura isso com bandas do tipo Toxic Reasons e o próprio TSOL... sem a gente conversar a respeito calhou que o Rafa tava com essa vontade, de fazer um som com esses timbres 80's mesmo. E isso me traz uma nostalgia ótima, me leva para um tempo que eu era um guri de um bairro pobre de Porto Alegre, e era diferente dos outros: tinha 10 anos e andava com os caras de 25, andava de skate e escutava Adolescents, Dead Kennedys, Agent Orange, pirava no visual "Team Alva" quando saiu aquela foto nas revistas de skate. Eu sonhava em ter alguém para amar, tipo skate punk romântico. Não tinha o Jawbreaker ainda e eu já era aquilo que fala nas letras... eu tinha 15 anos e nunca imaginaria que um dia ia me preocupar com o aluguel, com o plano de saúde... Cerezo saca? É acordar cedo, tomar um café e ir pra guerra. É São Paulo.

A gente não é daqui, mas essa cidade nos escolheu, a gente chegou aqui e ficou. O Rafa é do Rio, eu sou de Porto Alegre, o Babalu é de Aracaju, mas a banda soa de São Paulo. Não acham?








sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

KÄNELA VERDË JÄPANESE



2011.
Enquanto os cadáveres esquartejados de animais são carbonizados em uma grelha 
improvisada, três jovens roqueiros contam histórias do passado antes que suas memórias pifem. Apesar do assunto ser recente, o trio capixaba tem muitos anos de história no meio onde costumam circular.


1995. Nessa época brotava banda hardcore em tudo que é fresta. Em Vila Velha o Mukeka di Rato era mais uma no meio da multidão com a sua demo tape “Sobrevivência”. Assim como as demais bandas da época, estava fadada a ser mais uma aventura de adolescentes que queriam curtir a vida, fazer barulho e tomar umas cachaças de vez em quando. Mas não foi bem assim.

2007. As portas do avião se abrem no país do sol nascente. Misturados entre os passageiros estão três turistas brasileiros que (para as autoridades) foram apenas visitar um amigo. Atrás do vestuário social e semblante de pessoas sérias estão escondidas as reais identidades de Mozine, Paulista e Sandro.


Muitos discos depois, tours, milhares de latas de cerveja e quilos agregados ao corpo, o Mukeka di Rato pisa pela primeira vez no Japão para 10 shows em 9 cidades, sem instrumentos e merchadising: só com a cara, coragem e um japa maluco com cabelo de cachorro que atende por Yuki.

Os 15 dias de aventuras foram registrados com imagens que vão desde porres monstros até visitas a templos budistas, passando por banhos públicos (sim, eles aparecem nus!), overdose de chá verde, comidas exóticas, shows, um falo fumante e a quase morte coletiva no mar. Como foram eles mesmo que gravaram (e quase sempre com teor etílico elevado) é necessário se acostumar com imagens tremidas, foco no assoalho e chicotes violentos. Era o que tinham em mãos. E assim foi. E como não poderia deixar de ser.

As aventuras dos roqueiros capixabas também servem de aperitivo para conhecer um pouco a cena underground japonesa, que é bem parecida com a nossa: vista com maus olhos pela sociedade e repleta de seres toscos e loucos, fazendo com que os canelas verdes se sentissem em casa.



2012. Como se não bastasse o registro histórico, com esse lancamento ainda tem um DVD bônus com imagens de bastidores, passeios e um show na íntegra em Vitória, que tem grandes chances de ser uma das gigs mais selvagens já vistas, na qual banda e público se misturam em uma massa só, cantando e suando juntos. Coisa fina.

Contrariando todas as estatísticas, o Mukeka di Rato sobrevive. Naquelas de matar a cobra e mostrar o pau, fizeram tour no Japão (coisa que nem banda famosa e rica faz) e registraram tudo nesse DVD que já é histórico para o hardcore brasileiro. Vaso ruim quebra fácil não.



>> Veja abaixo o trailer do documentário que pode ser adquirido na gravadora de discos Läjä Recordz.