segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

ENTREVISTA RENATO DONISETE - FANZINE AVISO FINAL



Uma das características mais marcantes dos FANZINES é sua curta duração, difícil encontrar um que dure cinco, seis anos. Na contramão desse paradigma está o AVISO FINAL que completa em 2010 seus 20 anos. Aproveitando a nobre ocasião, o ZINISMO entrevistou o pai da criança, Renato Donisete, que merece toda nossa reverência!

O AVISO FINAL zine surgiu em 1990 idealizado pelo professor de educação física Renato Donisete Pinto, 37 anos, morador de São Caetano do Sul. Sua primeira edição (na época # 0) foi lançada em setembro daquele mesmo ano no projeto Rock in Rua em Santo André com shows com as bandas DZK e Insulto Oculto. Desde o início a proposta foi divulgar o trabalho musical das bandas punks da região do ABC paulista. Por suas páginas passaram bandas novas (como Leptus Pyróze, Sobreviventes do Aborto, FDS, etc) e bandas já consagradas (como Cólera, Garotos Podres, etc). Durante os primeiros anos o zine teve a preocupação de resgatar a memória de bandas extintas da região.

Foram feitos levantamentos históricos dos grupos Ulster, Hino Mortal, Varsóvia, Brigada do Ódio e Síndrome de Down. Alguns grupos internacionais também tiveram destaque na publicação. Foram feitas entrevistas com os italianos do This Side Up, os americanos do Rhythm Collision e matéria com os suecos do Wolfbrigade.

Durante o ano de 1996 o zine foi distribuído em Portugal pelo fanzine luso OVER12, num intercâmbio que envolvia os 2 zines. Em 1998 foi idealizada uma cooperativa que englobava 6 bandas da região, o zine, o artista gráfico Umberto Darós (criador do logo do Aviso Final), o fotógrafo Amarildo Corrêa e os selos ABC Records e Rasura Records. Dessa forma foi lançada em novembro a COLETÂNEA AVISO FINAL com os grupos FDS, Ação Direta, Censorshit, Overlife, Negative Control e Hino Mortal. Numa tiragem limitada de 500 cd´s este trabalho foi parar em Portugal, EUA, Alemanha e França, com críticas bem positivas da imprensa especializada.

No período de 2000 à 2003 o zine ficou disponível na Internet. No ano passado voltou a ser impresso, depois de vários pedidos. Em 2006, para comemorar os 15 anos do AVISO FINAL ZINE foi lançada a segunda coletânea, desta vez com as bandas punks DZK, Ação Direta, Gangrena, Aviso Final, FDS, Rebeldia Incontida, Leptus Pyróze, Insulto Oculto, Síndrome de Down? e Hino Mortal. Anexo ao cd um fanzine com o histórico destas bandas. Esse cd teve o objetivo de resgatar o trabalho destes grupos (alguns inclusive já acabaram) e divulgar um pouco o grito de insatisfação desta geração de filhos de operários do ABC paulista.


ZINISMO: Como foi seu começo com os fanzines?

RENATO: Comecei com esta história de fanzines em 1989. Já era um apreciador de fanzines neste tempo. Era colaborador do zine Mundo Underground da Vila Prudente. Depois de um tempo comecei a ficar insatisfeito com uma série de coisas; então, o Laércio Gonçalves na época guitarrista da banda Insulto Oculto falou o que fazia tempo queria ouvir: "Porquê você não faz um zine?". Em poucos meses estava lançando a edição número zero no show do próprio Insulto Oculto em setembro de 1990, no projeto Rock in Rua em Santo André. Neste show eu conheci o locutor e apresentador Miguel Anselmo, juntos fizemos uma única edição do zine TodaTribo em 1991. Este fanzine abrangia outros estilos musicais do rock.

Você já faz fanzines há duas décadas. Neste meio tempo surgiu a internet e muitas coisas mudaram na cena underground. Como você encara o papel dos fanzines em meio a estas mudanças? E atualmente?
Muita coisa mudou nestes 20 anos. Principalmente o avanço tecnológico, que nos favoreceu bastante. No começo os fanzines eram datilografados com colagens, xerox reduzido, etc. Hoje em qualquer micro você consegue fazer uma diagramação legal. Nesta brincadeira surgiu a internet e mudou tudo...Eu preferi manter o zine no formato impresso. Acho que tem até um fetiche de folhear, colecionar, etc. É como o LP, você coloca na vitrola, folheia o encarte, etc.Tem todo um ritual. Muita gente migrou para net, com blogs, fotologs, sites muito bons e conteúdos fantásticos. A informação acaba circulando muito mais rápida. Só que é tanta informação que muitas vezes não conseguimos digerir e fica um negócio cansativo. Neste tempo todo, especificamente com relação a cena- que aliás eu questiono se existe realmente -apareceram modismos, muitas coisas avançaram e houve diminuição de radicalismos e etc. O que eu posso afirmar que tudo que tinha uma verdade por trás continua aí. Veja o Ação Direta, o DZK e um monte de gente que continua na batalha e consegue manter esta cena (?) viva. Atualmente vejo com bons olhos o pessoal se organizando, fazendo festivais e fazendo as coisas acontecerem. Um exemplo é o belo trabalho do Cidadão do Mundo aqui no ABC. Eles promovem shows, festivais, oficinas, possuem uma web rádio e movimentam este cenário cultural. Isto é muito bom!



Um fator que faz muitos fanzines acabarem é o financeiro. Como tem feito para manter a longevidade do Aviso Final?
Com o apoio de selos e lojas que nos dão a maior força! Aproveito o espaço para agradecer o Marcelo da Absurd Records e loja Extreme Noise, o Xinês da Corsário Discos e loja Garimpo Cultural, o Alexandre da Cut Throat e o Carlos da Sensorial Discos. Além de gente como o Renan da Terrotten Records, Sérgio da No Fashion, Boka da Pecúlio que dão a maior força na divulgação. Sem eles não teria atingido a tiragem dos 1000 exemplares por edição. Além, é claro, do pessoal que escreve e manda selo. Nos dias de hoje ponho pouco menos dinheiro do bolso...

Um lance que está intrinsicamente ligado aos fanzines são os chamados "amigos de carta". Como funciona o lance seu com as correspondências, escreve todo dia? Sua caixa de correio fica entupida?
Hoje em dia nem tanto, afinal temos o e-mail para agilizar as coisas! No final dos anos 90 tive que abrir uma caixa postal, pois chegavam muitas cartas, cds e etc no meu prédio. O porteiro brincava que eu era o recordista de cartas. Recentemente, no 1º ENCONTRO DE ZINEIROS que aconteceu na loja Combat Rock, tive o privilégio de encontrar pessoalmente o Ricardo Knipl, que veio de Limeira prestigiar o evento e com o qual há muitos anos trocava correspondências. Este tipo de coisa é extremamente gratificante e é o que me mantém fazendo zines.

Se pudesse fazer uma lista com cinco grandes momentos (ou matérias) do Aviso Final, o que selecionaria?
Nestes anos eu destacaria o lançamento das duas coletâneas em cd com as bandas do ABC paulista e a repercussão que elas tiveram (resenha na Alemanha, EUA; tocaram na rádio italiana, etc). Gostei bastante da entrevista que fiz com o Português dos Garotos Podres quando voltaram da turnê européia. Cito também as conversas com o Xinês do Excomungados, o Fofão do Besthöven, o Dario Adamic da banda italiana This Side Up, o Gepeto do Ação Direta; e a inusitada entrevista com a Karina, garota de programa de luxo. Recentemente tive a felicidade de ganhar uma camisa e adesivos do Aviso Final feitos pelo grande amigo e zineiro Job Fernando. Desculpe, mas é muito difícil destacar só cinco grandes momentos...



Para terminar gostaria que você indicasse bons fanzines de papel que são feitos na atualidade para os leitores do ZINISMO.
Bom, muita coisa legal tem surgido com uma diversidade de temas imenso. Os que tenho mais curtido: Karta Bomba zino do Job Fernando (kartabombazino@yahoo.com.br), o Baskulho da Samanta Ribeiro (histeria_zine@yahoo.com.br),Visual Agression do Ricardo Chakal (ricardothrasher@hotmail.com) Spellwork da Thina (tinacurtis11@yahoo.com.br). Zine Zero Três dOs Cigarristas Jurema Barreto e Zhô Bertholini (acigarra@ig.com.br), FanzinEX do Xinês (excomungados@ig.com.br). o NFL zine do Hamilton Tadeu (nflzine@hotmail.com), e por fim, o Velho Rabugento do José Edílson (velhorabugento@gmail.com). Aproveito o espaço para divulgar o livro “Imprensa Alternativa do ABC” da Olga Defavari que trata muito bem da história dos fanzines na região. (olgadevari@yahoo.com.br) Vale muito a pena conhecê-lo...

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6 comentários:

  1. O Renato é um guerreiro e o Aviso Final é um exemplo. Essa entrevista não é apenas legal: ela é necessária!

    Parabéns Grão, pela iniciativa. Parabéns Renato, por manter viva a tradição zineira do ABC.

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  2. Ah, e o Job Fernando que ele cita é a lenda punk The Katz! Grande The Katz!

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  3. Fiquei emocionado com este seu post. Eu colaborei em muitos fanzines antigos, como o Sonidos y ideas, o Ekletik (tudo muito old school) e quando vi estes deu saudade do recorte e colagem, das letrinhas pequenas, dos flyers do Snooze, mukeka de rato, mechanics, ovos presley, cabrunco zine, e tantos outros... Parei quando mudei para curitiba onde passei os piores 10 anos da minha vida e lá não existe espaço para mulher. Estou em Santa Catarina agora, e sempre com saudade!
    Parabéns por não deixar morrer a tradição.

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  4. Salut compas!!!!

    Excelente entrevista, e faço minhas as palavras do Viegas, Renato é guerreiro!

    Vida longa aos zines, que com todo o advento que só cresce da tecnologia, eles permanecem fieis e fortes em suas trincheiras!!!!

    Postei no blog www.provosbrasil.blogspot.com essa entrevista!

    Provos Brasil

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  5. muito boa a entrevista, o AF é um clássico!

    não me canso de dizer que, infelizmente, só dá valor a zine quem faz ou já fez um!

    longa vida ao AF e aos zines de papel em geral!

    ah, e aos "amigos de carta" tb!
    :-)

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  6. Escrevi ao Renato Donisete, e ele - muito gentilmente - me enviou exemplares do fanzine dele, bem como do jornal Microfonia. Fiquei bastante satisfeito. Aproveitei e escrevi um texto sobre o Aviso final no meu blog Expressão Liberta. Quem quiser ler basta acessar:
    http://expressaoliberta.blogspot.com/2011/07/duas-decadas-numa-midia-guerreira.html

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Andarilhos do Underground: ZINAI-VOS!!!