Por Douglas Prieto*
Em 1989, comecei a fazer o segundo grau, ou ensino médio, numa escola do Ipiranga, chamada “Alexandre de Gusmão”. Um dos meus primeiros colegas foi um tipo meio lunático, um sujeito chamado Danilo, apelido Tucano (por conta da composição facial) e óculos espessos. Um cara daqueles que não gostava de estudar, mas se garantia nas provas graças a sua inteligência.
Acabamos nos tornando amigos por conta do gosto musical, mesmo sem ter nenhuma banda em comum. Eu ia atrás de tudo que tinha alguma ligação com skate, e vivia num mundo de TSOL, Suicidal Tendencies e bandas de metal. Ele era um aficionado pelo que chamava de "Industrial" e EBM (Eletronic Body Music), e vinha com Nitzer Ebb, Neubauten e se esforçava diariamente para me mostrar que o Front 242 ia muito além do que aparecia no Clip Trip, extinto programa da TV Gazeta. Mas o que era exatamente igual é que nós dois não queríamos escutar as bandas que chegavam aos nossos ouvidos, mas sim queríamos escolher o que ouvir. Essa atitude em relação a música nos tornou mais próximos do que se gostássemos do mesmo rótulo.
Respirando música 24h por dia (só a revista Mad, que encapava seus livros e cadernos, o fazia mudar de assunto), ele arrumou um trabalho na Mansão dos Nobres, casa noturna que funcionava na Av. Ricardo Jafet. E lá, ele aproveitou-se da boa biblioteca musical de maneira camarada. Certa vez, me gravou um K7 com LL Cool J de uma lado, N.W.A. do outro. “Vocês skatistas gostam de rap, não é?” foi a frase que me disse ao me entregar a fita (sem esquecer de exigir uma nova fita virgem).
Mas, surpreso mesmo, fiquei quando ele me trouxe esse LP, devidamente subtraído da Mansão, em sua última semana de trabalho por lá. Era o “New Traditionalists”, disco do Devo lançado em 1981, devidamente etiquetado e numerado pelo antigo proprietário. Ele me entregou o disco sem capa, disse que estava saindo do emprego, que esse disco jamais tocaria naquela casa, e portanto, não faria falta alguma lá. Tenho apenas dois LPs que guardo até hoje, e esse é um deles (o outro é do Grinders).
Logo depois desse presentão, o ano letivo acabou, e o cara sumiu. Quando fui no show do Front 242, há cerca de 6 anos, procurei-o na platéia, e ele não estava lá. Nunca mais vi o tal do Danilo, e não me recordo do sobrenome dele, de forma que não consegui encontrá-lo via redes sociais. Queria saber o que está ouvindo hoje em dia um cara que em 1989 falava com empolgação sobre como era bom “o novo 7 polegadas do Cassandra Complex” numa sala de aula de um colégio estadual.
*Formado em Propaganda e Marketing, Douglas L. Prieto é redator, colunista e blogueiro da Revista CemporcentoSKATE e Editora ZY. Em 2011 voltou a sentar na cadeira da escola, e está fazendo Pós-Graduação em Jornalismo e Direção Editorial na ESPM. Mas, acima de tudo, é skatista de alma, levando a vida em cima do skate desde 1987. Essa é sua primeira colaboração direta no Zinismo, e esperamos que seja a primeira de muitas.
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