quinta-feira, 3 de março de 2011

ZINESCÓPIO - ACERVO DE FANZINES EM PDF + ENTREVISTA COM JAMER



Uma das boas novidades de 2011 com relação ao mundo dos fanzines é o blog ZINESCÓPIO feito pelo fanzineiro Jamer.
A proposta do fanzineiro é disponibilizar semanalmente fanzines de seu acervo pessoal para download no formato PDF .

O ZINISMO tinha a intenção de entrevistar Jamer, mas como nosso companheiro de guerrilha Law Tissot foi mais ágil e fez um ótimo trabalho, resolvemos no melhor dos espiritos fanzineiros e da ética "copy-left", reproduzir a entrevista que saiu publicada originalmente no blog da Fanzinoteca Mutação. ZINISMO recomenda!



Fanzinoteca Mutação: O que te motivou a criar o Zinescópio?
Jamer: Possuo uma grande coleção de fanzines impressos. Utilizei essa coleção na minha pesquisa no mestrado (mestrado em educação, defendido em agosto de 2010, na UFRGS), inclusive como referência bibliográfica. Utilizei também em algumas oficinas que ministrei. Hoje em dia com o acesso à informação online e cada vez mais rápido achei interessante disponibilizar essa coleção na internet, digitalizada. Comecei meio por acaso, digitalizei alguns zines em janeiro, e acabei colocando na rede. Na mesma semana tive a idéia de criar um blog, pra organizar e divulgar melhor. A aceitação foi imediata. 700 acessos no primeiro dia do blog, dezenas de e-mails elogiando a iniciativa. De lá pra cá, diversos contatos e colaborações. Muito bacana. O blog tem menos de um mês no ar, com uma média de 160 acessos diários. Tenho tentado postar 1 zine por dia, no mínimo.

Quais fanzines você editou e/ou participou?
Comecei a editar fanzines na escola, em 1994, no interior do Rio Grande do Sul, em Santa Maria. Fiz um "jornalzinho" da escola com a ajuda de alguns colegas, com quadrinhos e charges zoando os professores, e outros textos. Fui expulso do Diretório Estudantil na segunda edição do fanzine, devido ao material publicado, que foi taxado de inapropriado. Em 2000 comecei a escrever uma espécie de "coluna" chamada Inforégo, com crônicas, contos e resenhas de discos, filmes e livros. Enviava esses textos por e-mail e logo virou um site (e-zine) que ficou no ar em 2001 e 2002. Esse material se perdeu, e o site não existe mais. Depois editei um fanzine impresso chamado Badalhoca, sobre cultura pop em geral. Foram lançadas 3 edições, em 2004 e 2005. Na verdade o fanzine não morreu, e pretendo produzir mais números em breve. A segunda edição, inclusive, foi um projeto interessante, encartando o CD de uma banda de Santa Maria, chamada Pastor Alemão e a Murcilha da Graça. Os exemplares desta edição, na época, foram vendidas por um valor que custeasse a produção dos CDs e as cópias dos zines. Colaborei com o fanzine Dalí, de Santa Maria, e com um e-zine chamado Quimera, de Campinas/SP, entre outros sites, blogs e fanzines impressos.

Estaremos vivendo uma nova onda dos fanzines?
2011 está se mostrando um possível ano para um "revival" dos fanzines impressos, ou pelo menos um retorno da discussão sobre a linguagem e os mecanismos de ação dos fanzines. O documentário Fanzineiros do Século Passado, o Anuário de Fanzines do Ugra Press, o Ugra Zine Fest, a Fanzinoteca Mutação, o Zinescópio, a Tour de Zines que aconteceu na Bahia e em São Paulo acabaram dando uma mexida nessa cena um tanto adormecida dos fanzines. Sem esquecer dos estudos de pós-graduação do Gazy Andraus e a Editora Marca de Fantasia (Henrique Magalhães / Edgard Guimarães), que apesar de serem iniciativas de longa data incentivam e possibilitam essa movimentação e esse revival em pleno 2011. Acho que tem um charme no fanzine impresso que é imortal e parece que estas iniciativas que apesar de terem o mesmo tema como motor - o fanzine - são ações independentes umas das outras, que acabam coincidindo numa mesma época e evidenciando a potência dos fanzines em pleno 2011.

Tem acompanhado a atual cena nacional e do exterior?
Tenho me fixado mais nos estudos em educação, e utilizado a estética e a tática dos fanzines de uma forma mais pontual. Como a minha preocupação de estudo não é com a cena, com a distribuição, ou com a rede, e sim com o mecanismo articulador do “dizer” do fanzine, ou melhor, minha preocupação é com aspectos que dizem respeito à linguagem libertadora do fanzine em sala de aula, acabei me distanciando um pouco das cenas. Parei de trocar fanzines há algum tempo. O próprio Badalhoca, meu zine, em 2004 e 2005 teve pouca circulação via correio. A coisa ficou mais na mão, mesmo. Um resgate interessante dessa rede de troca e contato que se estabelece sobre o fanzine e principalmente os aspectos que levaram à sua formação é um dos aspectos mais positivos, pelo meu ponto de vista, de ações como a de Márcio Sno ao produzir o documentário Fanzineiros do Século Passado.



É possível existir zines impressos (no tradicional xerox) nesta realidade de redes sociais?
Esse é um ponto bastante interessante e atual. Outro dia eu estava pensando sobre os zines, sobre as trocas e principalmente sobre as informações. O que acontecia comigo e com muitos de meus amigos é que muita informação nos anos 90, sobre bandas principalmente, mas também sobre arte, sobre cinema e sobre quadrinhos precisava ser "garimpada". Naquela época as informações eram preciosas. Revistas como Bizz, General, as gringas, e a opinião e o conhecimento dos amigos eram a essência desse "garimpo" cuidadoso. Gravar em k7 um disco recém lançado era uma tarefa difícil, dependendo do disco e das condições. Uma banda lançava um disco lá fora e demorava meses pra chegar aqui no Brasil. Depois demorava meses pra você encontrar alguém que tivesse comprado o disco. Então você tinha um arsenal de fitas k7 virgens, levava na casa de um amigo e gravava (ouvindo) o disco todo. Agora basta um clique e uma conexão ADSL pra baixar o disco todo em poucos minutos. Os zines tinham um papel importantíssimo para a cena independente, em qualquer lugar do mundo. Era uma forma de mostrar e distribuir algo que poderia ficar restrito a poucas pessoas. O alcance do zine era pequeno, ainda assim. Hoje em dia, competir com a internet, neste sentido, é um contrasenso. Essa função o fanzine não cumpre mais, e jamais conseguirá cumprir novamente. Acho que, hoje em dia, o fanzine em papel pode desempenhar outras funções. Uma delas, por um lado, é parecida com a do vinil. Uma questão estética, de beleza e de tato. Um charme do colecionador, para o colecionador. Outra característica, que é própria dos zines é a estética suja, borrada, da colagem, do amadorismo, do xerox. Isso a internet não tem.

Quais foram os momentos zineiros mais importantes da história dos fanzines brasileiros em sua opinião?
Os fanzines surgiram como suporte para divulgação e propagação de alguns tipos de manifestação que não conseguiam o alcance do grande público, pois não conseguiam espaço em publicações. Foi o caso dos contos de ficção científica, dos quadrinhos e do movimento punk. Aqui no Brasil não foi diferente, e o momento zineiro que considero mais importante historicamente diz respeito aos quadrinhos nos anos 60 e 70. Formou uma rede que possibilitou praticamente tudo que existiu em termos de publicações alternativas de norte a sul do país dos anos 60 até recentemente. Outro período importante foram os anos 90 com os fanzines sobre música (do indie ao hardcore) e cultura pop, onde os fanzines tinham papel fundamental na divulgação de bandas e selos da cena independente nacional.

Como é a sua coleção de fanzines?
Não cheguei a fazer uma contagem da coleção, mas creio que tenho cerca de 300 exemplares de fanzines de vários lugares do Brasil, de diversos gêneros (música, quadrinhos, literatura política) e formatos. Em maior número possuo zines de música e cultura pop, e dentre os mais conhecidos posso citar Imaginary Friends, Scream & Yell, Magazine, Tupanzine, Tom Zine, Meninas Viciadas e Tudo É. Quanto às raridades um dos fanzines mais legais da coleção é o Atum, de Santa Maria/RS, e a primeira edição do Tupanzine.

Você tem bibliografia especializada no assunto 'fanzine"?
Existe muito pouca coisa publicada em português sobre fanzines e/ou mail-art. Sobre o tema tenho o livro "O que é Fanzine" (Henrique Magalhães). Também tenho outros livros que me auxiliam, mas não tratam especificamente sobre fanzines. Posso citar "A revolução eletrônica" (William Burroughs), "Mix tape - The art of cassette culture" (Thurston Moore), "Mutações em educação segundo Mcluhan" (Lauro de Oliveira Lima), "O que é Punk" (Antonio Bivar), "Kafka, por uma literatura menor" (Gilles Deleuze e Félix Guattari), “Espaço N.O. - Nervo Óptico” (Ana Maria de Carvalho), livros e artigos de artistas como Paulo Bruscky, são alguns materiais que eu utilizo bastante. Artigos, dissertações e teses sobre fanzines e mail-art podem ser encontrados online e é uma boa ajuda pra quem pesquisa o assunto. O pessoal da Zinco, uma ONG de Fortaleza/CE que hoje em dia infelizmente não está mais em atividade, disponibilizava em seu site (que está fora do ar) material deste tipo. Um material bastante interessante são os textos do rizoma, um site com um acervo enorme de textos sobre micropolítica, filosofia, arte, cibercultura e ativismo. O rizoma também está fora do ar, infelizmente, mas seus arquivos em pdf estão disponíveis na rede. Existem alguns livros sobre fanzines que são interessantes, que conheço mas não possuo, da editora Marca de Fantasia e também alguns livros importados, em inglês, que podem ser encomendados via Amazon.

Qual a importância dos fanzines neste início de século?
O fanzine possui um mecanismo de sedução interessantíssimo. Este é, por exemplo, um dos trunfos da utilização dos fanzines como suporte de experimentação em sala de aula e outras situações pedagógicas, exercitando a criatividade, a arte, a escrita, o pensamento. Esta propriedade que eu chamei de "mecanismo de sedução" é particular da essência dos fanzines, é extremamente potente, e é aí que reside, a meu ver, um dos motivos que podem impulsionar alguém, hoje em dia, a produzir um fanzine. Porque é esta característica que os distinguem das redes sociais e dos blogs. Portanto acredito que um fanzine não pode mais ser produzido com o intuito de fazer circular uma informação, pois pra isso existe a internet, que cumpre esse papel de forma muito mais eficiente (e é por isso que estamos fazendo essa entrevista por e-mail e não por carta, por exemplo, por causa de uma eficiência comunicacional). Mas um fanzine pode ser produzido atualmente com outros intuitos. Esses outros intuitos, que são diversos, e dependem de cada um, de cada anseio, é que dão importância aos fanzines impressos nos dias de hoje.

Link da postagem original.

3 comentários:

  1. Mas é esse o sentido de tudo: unidos e esparramados pelo Brasil! Zineteando dos Pampas, Law

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  2. Estamos todos juntos! Os cavalheiros do apocalipse!
    Muita energia pro Zinescópio e Fanzinoteca Mutação!
    Bravos guerreiros Jamer e Law!
    Fortes abraços!

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Andarilhos do Underground: ZINAI-VOS!!!