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O trabalho do ilustrador, artista plástico, educador e zinista
Flávio Grão está quase que onipresente nos fanzines lançados nos últimos anos. Seus traços fortes, rústicos (quase se assemelhando a xilogravuras) viajam em um roteiro filosófico-poético, sempre passeando pelo inconsciente individual e coletivo.
Recentemente lançou duas edições do fanzine
Manufatura, nas quais conta histórias sem utilizar textos: apenas o apelo visual com um pé no surrealismo, que transmitem muita informação. Mas, para isso, é necessária a observação atenciosa do leitor. Não basta apenas folhear, tem que explorar cada ilustração para entrar no universo do autor. Que, depois percebemos que também é o nosso universo.
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Cortex traz a mesma proposta, porém de uma forma diferente: o autor se enveredou no universo da colagem para contar a história de um personagem que se assemelha com um cérebro, tendo como cenários imagens clássicas de cidades e de situações.
A prática de recortar e colar é algo fácil. Nem tanto. Saber harmonizar uma imagem sobreposta sobre outra e ainda ter o objetivo de contar uma história sequencial é para poucos. Grão começou Cortex em 2008 e finalizou na segunda metade de 2011. E o tempo talvez tenha sido fundamental para as ideias fluírem para alcançarem o resultado final.
Algo que é marca nos últimos trabalhos de Flávio Grão, é a experimentação em cima de papéis de gramaturas e texturas diferentes. Nesselançamento utiliza de papel vegetal para sobrepor a capa de colorset e o miolo de vergé. Mostrando, inconsciente ou não, que o fanzine impresso para ser atrativo e necessário, necessita ter um apelo muito além que textos e desenhos: precisa ter um “valor” de tato e visual, que já é tendência na Europa e Estados Unidos e que acredito ser o futuro dos zines impressos por aqui.
Cortex não é algo simples de se adentrar. Talvez facilite nas referências bibliográficas que cita ao final da publicação: o artista plástico surrealista alemão
Max Ernst, o psicólogo bielo-russo
Lev Vygotsky e o pintor e cineasta da pop art estadunidense
Andrew Warhola. Você não entendeu ou não faz ideia de quem se trata? Dá uma pesquisada rapidinha e depois volte aqui nesse ponto.
Pronto. Agora é possível entender onde mais ou menos queremos chegar.
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A história de Grão começa com uma simples dor de cabeça. Essa dor toma conta do paciente que consegue enxergá-la através do espelho. Aos poucos, esse diagnóstico começa a tomar dimensões gigantescas e até inacreditáveis. É o absurdo se mesclando com o real. O caos individual transformando-se no pop coletivo, sem percepção do monstro que foi criado. A desgraça em larga escala de produção. Quem sabe, com essa intenção, no verso de cada obra, o autor sugere um cartão postal, para conversar conceitualmente com a história.
O nome do zine sugere o termo “vortex”, que pode ser definido como movimentos espirais ao redor de um centro de rotação. Com isso, tudo que envolve essa publicação tem um porquê e uma razão de ser. Nada é gratuito.
Grão surpreende mais uma vez, fugindo do lugar-comum, das teorias absurdas, do egocentrismo, para que, de uma forma inteligente, denunciar e clarear a realidade consumista que está aí na nossa frente e que não temos olhos para enxergar. Ou não queremos.
MAIS GRÃO
Como se não bastasse ser "fugurinha carimbada" no mundo dos fanzines, Grão está se enveredando no universo dos livros. Recentemente foi convidado pela
Ugra Press para ilustrar o primeiro livro de contos de
Leandro Márcio Ramos, o
Tudo que é grande se constrói sobre mágoa.
A publicação foi feita de forma totalmente manual, com uma montagem peculiar, feita uma a uma. Acompanhe
aqui todo o processo de produção.
LANÇAMENTOSO Cortex, e o Tudo que é grande se constrói sobre mágoa serão lançados no próximo sábado, 10 de dezembro, no
Hotel Tee's, em São Paulo, conforme exibe o cartaz abaixo.
Na oportunidade, Grão também lançará um pôster e uma camiseta de tiragem limitada com suas ilustrações.